quinta-feira, 20 de setembro de 2007

Miojo Ex-tunc ou Miojo Infungível

Contribuição do Chef Juarez

Como excelente cozinheiro que sou, farei uma mistura: a receita e a história de seu desenvolvimento, de modo que este breve ensaio tenciona servir, quiçá, para apontar caminhos na evolução de uma nova ciência. Uma ciência de seriedade e de pertinência tão grandes a ponto de poder ser comparada com a própria ciência do direito; a arqueologia das receitas gastronômicas (ARG!).
Nossa história começa com dois jovens esfomeados no auge de sua força física e virilidade. Reunidos em casa de um deles, acabamos por ouvir o seguinte aviso da senhora mãe dona-de-casa:
_Meninos, estou de partida. Vocês precisarão alimentar-se por seus próprios méritos.
Numa hora como esta qualquer reflexão torna-se desnecessária. Chegada a hora do almoço, verificamos o conteúdo do armário da cozinha. Encontramos:

1. um pacote de miojo no sabor galinha,
2. um pacote de miojo no sabor feijão,
3. um pacote de miojo no sabor carne,
4. e, finalmente, um pacote de miojo no sabor quatro-queijos.

Regozijamo-nos e exultamos. Afinal, dois jovens no auge de sua força física e virilidade jamais se contentariam em comer apenas um pacote de miojo cada um. Faz algum tempo ouvi um relato de dois amigos de infância que, tendo apenas dois pacotes de miojo disponíveis, puseram-se a lutar até a morte de um deles, ocasião em que o vencedor pôde usar testículos, rim e fígado do vencido para acrescentar volume à sua receita (esta receita poderá ser enviada numa outra ocasião).
Aproveitando o auge de nossa força física e virilidade, pusemo-nos a espancar os pacotes de miojo, como forma de dar vazão a nossa rebeldia e de representar, assim, toda a brutalidade de uma juventude transviada e em plena crise de valores. Uma dica: experimente imaginar a cara de algum dos seus professores estampada na embalagem do macarrão instantâneo, isso facilitará bastante o processo. Quando tudo o que restou foi uma farinha amarela, conseguimos uma panela rasa e larga e pusemos dez copos de água para ferver. Sim, dez copos, porque não é cabível que dois jovens no auge de sua força física e virilidade possam contentar-se em esperar vinte minutos para o preparo de quatro miojos (três para o macarrão + dois para tempero e ajustes finais); razão pela qual resolvemos misturar os quatro numa única receita. Como era a panela rasa e larga, não surgiram bolhas indicando a fervura da água, único sinal que nós, jovens no auge de nossa força física e virilidade sem nenhuma obrigação de conhecer sutilezas culinárias, conhecíamos para indicar esse processo de transição da água de seu estado líqüido para o estado gasoso. Dessa maneira, atiramos os quatro miojos e seus temperos na água assim mesmo. Nesse ponto há uma variação possível: meu querido amigo Weslley atirou um tempero ainda em sua embalagem na panela, momento onde eu, descrente de estar frente à criação de um gênio da culinária, o removi. Mais tarde, arrependi-me, pois seria impossível que a inovação de meu amigo pudesse ter tornado pior aquilo que restou pronto na panela.
Após dez ou quinze minutos esperando que uma bolha, uma única bolhinha, uma mísera e insignificante bolinha de ar surgisse do fundo da panela indicando o momento de desligar o fogo, chegamos à conclusão de que de panelas rasas e largas, talvez por alguma insuficiência tecnológica, não comportam tão sofisticado sinal. A própria fome, então, se encarregou disso e nos deu o esperado sinal dizendo que estava pronto. Neste momento o miojo se encontrava intumescido de água, imensamente amolecido, com o aspecto mais deplorável possível. Quanto ao gosto, seguindo o princípio do pior sabor (quando misturados itens de sabores diferentes, o gosto geral da mistura resultará no sabor do pior deles), aproximou-se de uma exponenciação do odioso quatro-queijos. Por esses e outros motivos, comemos com grande felicidade e, em verdade, mal pudemos manter o alimento em nossas bocas, dado o tamanho de nossos sorrisos.

Conclusão

O princípio da dignidade da pessoa humana é o maior de todos os princípios.

O que nos leva à conclusão lógica de que o direito não pode ser senão o conjunto das normas indispensáveis para a convivência harmônica em sociedade.

Recentemente, munidos dos maiores avanços tecnológicos na área de restauração de documentos, um grupo de pesquisadores fez uma descoberta que revolucionará a história do Direito. Três pequenas letras ("m", "i" e "o") foram descobertas desgastadas pelo tempo naquela que é e sempre será a maior de todas as lições do excelso pretor romano. Eis em primeira mão, seu verdadeiro, e até então oculto, sentido:

Ubi societas, ibi mio-jus.


Bibliografia

REALE, Miguel. Lições preliminares de direito. Editora saraiva. 2005.
AMARAL, Francisco. Direito civil – Introdução. Editora saraiva. 2006.
FABRIZ, Dauri César. A Estética do Direito. Editora da UFMG. 2001.
GRAU, Eros. Metelança jurídica. Editora da Star Drink. 1969.
MOUSSALEM, Tarek Moyses. Novos caminhos no puxa saquismo kelseniano. RT. 2008.
POMPEU, Júlio César. Nós, os maquiavélicos. Editora-já-vai-sair. 3915 (e olhe lá!).